sábado, 8 de novembro de 2008

OBA, OBA, OBAMA


Maria Lucia Victor Barbosa
07/11/2008

Nesse momento difícil de sua economia, os norte-americanos ouviram de Barack Houssein Obama o discurso que os fez sonhar novamente sonhos de prosperidade, apesar do candidato não apresentar propostas consistentes no sentido de resolver os enormes desafios que o país apresenta. E diante do descontentamento popular com relação ao presidente Bush, a palavra mudança, prometida várias vezes pelo democrata, soou como esperança.

Obama conquistou principalmente os negros, os hispânicos, as mulheres, os jovens, sendo que o crescimento urbano e da imigração foram também fatores que favoreceram sua eleição. O democrata atraiu, inclusive, parcelas de eleitores mais conservadores e, por isso, disse um de seus eleitores ilustres, Colin Powell, ex-secretário de Estado dos EUA: “O que Obama fez foi incluir todos através de linhas raciais, culturais, religiosas e de geração”.

A capacidade de incluir tantos setores da sociedade se deveu em parte ao discurso sem tom racial, em que pese 95% dos negros terem votaram em Obama. Na verdade, o que o presidente eleito fará pelos negros, principalmente os mais pobres, ainda não se sabe. Mas, sem dúvida, o mulato que chegou ao poder mais alto da Nação encarna a revanche de um passado de segregação que no presente se traduz por um racismo às avessas: o ódio dos negros aos brancos.

Barack Obama provocou emoção em todo mundo. A Europa, que achava que o poder dos Estados Unidos definhava diante da ascensão econômica da China, da Rússia e da Índia ficou deslumbrada e tranqüilizada diante da possibilidade de reforço do poder da pátria da democracia.

Na América Latina, inclusive no Brasil, além do teor emocional ligado à cor da pele do candidato, a “obamamania” teve caráter ideológico. Acredita-se que Obama seja comunista. Nesse sentido é emblemático que o historiador Joel Rufino dos Santos relembre Marx e sonhe utopicamente com um comunismo norte-americano: “Acho que o velho (filósofo e teórico do comunismo Karl) Marx de vez em quando deve ser lembrado. Ali (Estados Unidos) é onde pode ter um socialismo realmente democrático. Porque a economia é mais desenvolvida e o povo tem mais tradição de respeito ao outro”. (Folha de S. Paulo. 6/11/2008). Certamente o historiador não se lembra do fato de que as idéias de Marx postas em prática geraram aberrações totalitárias que nivelaram por baixo na opressão e na miséria.

Em todo caso, foi impressionante como a eleição de Obama fez desaparecer como num passe de mágica em todo mundo e, sobretudo, na América Latina, o feroz e odiento antiamericanismo que culpa os Estados Unidos por todas as nossas mazelas e fracassos. Agora se espera uma nova ordem mundial, uma nova era e mesmo antes da posse Obama já é visto como presidente de fato do qual se aguarda mudanças rápidas

Na América do Sul o oba, oba Obama se alastrou por todos os países. Mesmo Hugo Chávez, o criador do nebuloso Socialismo do século XXI, que não consegue discursar sem atacar violentamente os Estados Unidos, e seus companheiros do “Eixinho do Mal”, Evo Morales e Rafael Correa, pareciam deslumbrados com a eleição “de um afro-descendente para a cabeça da nação mais poderosa do Mundo”. Enquanto isso, Lula da Silva, se revestindo de grande líder latino-americano e mundial mandava seus pedidos para Papai Noel Obama: uma política mais ativa em relação à América Latina, o fim do embargo norte-americano a Cuba e a resolução do conflito do Oriente Médio.

Barack Hussein Obama, que terá imensos obstáculos pela frente, é um homem de esquerda, ou seja, um liberal conforme entendem os norte-americanos. Forçosamente, dada a situação em que o país se encontra, terá que ampliar um pouco o poder do Estado, algo que não é da tradição norte-americana. Ele prometeu coisas como apoiar uma lei federal que facilitará a sindicalização dos trabalhadores e quer ampliar também através da legislação, a cobertura de saúde para 50 milhões de americanos que ainda não dispõe disto. Contudo, não se sabe como ele se comportará diante da Rússia, da China, do Irã, da esquerda latino-americana. Mas pelo menos em seu discurso de posse ele mandou recados eloqüentes para o mundo:

Avisou que: “o caminho será longo. Nossa subida íngreme. Nós talvez não cheguemos lá em um ano ou mesmo em um mandato”. Mas reafirmou aquele espírito norte-americano que passa bem longe da mentalidade brasileira:

“Àqueles que querem destruir o nosso mundo: nós os derrotaremos. Áqueles que buscam paz e segurança: nós os apoiaremos. E a todos que vêm se perguntando se o farol da América ainda brilha como antes: nesta noite nós provamos mais uma vez que a verdadeira força da nossa nação não vem da bravura das nossas armas ou do tamanho da nossa riqueza, mas do poder duradouro de nossos ideais: democracia, liberdade, oportunidade e inabalável esperança”. Ao final do discurso, Obama repetiu seu refrão e a multidão bradou com ele: “Sim, nós podemos”.

Os obstáculos do novo presidente são tão grandes quanto as expectativas que se criaram em torno dele e só o tempo dirá o que pode acontecer nos Estados Unidos e no mundo. Afinal, políticos costumam ser metamorfoses ambulantes.

Maria Lucia Victor Barbosa é socióloga.
mlucia@sercomtel.com.br

9 comentários:

Flávia disse...

Não me assutarei se daqui a alguns meses surgirem bonecos do Obama...

Chantinon disse...

Meses?

http://pepecasals.wordpress.com/2008/10/22/demorou-barak-obama-action-figures/

Deftones disse...

Pareceu-me que a referida socióloga foi muito otimista em seu artigo. Eu não vou, apenas por mera rixa, dizer que Obama é puro "mais do mesmo". Mas, para mim, a grande vitória dessas eleições é o fato de os negros, os latinos, os jovens, entre outras categorias historicamente discriminadas terem se portado de maneira mais autônoma, ajudando a construir a candidatura massiva de Obama. Fiquei muito contente com o resultado dessa eleição, porque ela demonstra que os ares anticonservadores que têm soprado na América Latina também chegaram à terra dos ianques.

Mesmo assim, não espero mudanças relevantes na política e economia durante a gestão Obama... ele já deu mostras de que não produzirá nada que se aproxime de uma ruptura. Também não creio que ele venha amenizar a postura diante da esquerda latino-americana.

É curioso como tem gente que vê em cada declaração de Chávez uma mensagem implícita de que se constrói na Venezuela um regime forte e autoritário. Não sei como os mesmos que vêem isso também não percebem a mesma tendência autoritária em mensagens como: "àqueles que buscam paz e segurança, nós apoiaremos". Essa frase poderia ter sido facilmente proferida pelo George Bush nos meses pós-11 de setembro, se não o foi de fato. E é engraçado ver que o emocionante refrão de Obama tem notórias raízes latino-americanas - vide o "Yo Sí Puedo" (Sim, eu posso) cubano, que inclusive batizou seu método educacional que erradicou, aos olhos da ONU, o analfabetismo naquele países há bastante tempo e, há dois anos, na Venezuela.

Mas, aguardemos o início da gestão para comentários mais aprofundados e embasados... por ora, o artigo cai bem. Valeu!

Chantinon disse...

Leon,
Me tornei fã da Maria Lúcia por sua visão do Lulismo. Inclusive tem mais coisas dela copiadas aqui no blog (com autorização).

Eu adoraria estar errado sobre o Chavez, sobre o Lula, mas acho que nos próximos 2 anos a verdade se mostrará. Como não defendo bandeiras partidárias, voto nos que mostram algo que pareça sustentável. Comecei a aprovar o Obama antes dele ser escolhido pelo partido. Li algumas entrevistas e textos dele, e fiquei muito impressionado.
No mundo atual, não é possível imaginar um povo dominado e alienado como os alemães da era Hitler. A Globalização trouxe coisas boas também, uma delas é que mentiras ideologicas podem ser desmascaradas rapidamente, como todo o circo montado por Bush em suas guerras.
Torço pelo Obama, e se ele for pelo menos metade do que parece ser, vejo um futuro mais ameno que os dias de caos que vivemos hoje.

Kalunga disse...

Excelente texto!

mas sendo sincero, acho que o Obama não vai durar muito. É muita mudança para uma massa conservadora, militarista e racista que ainda exerce influência decisiva no que é feito nos EUA. Apesar daquele país viver num regime democrático estável, o retrospecto de assassinatos de presidentes não deixa de fazer pairar esta perspectiva sombria. Se um John Kennedy, branco e mebro da elite, que queria promover mudanças relativamente radicais no modus operandi norte-americano foi assassinado, o que dirá de um presidente negro?

Outro dia li um excelente artigo do Arnaldo Jabour onde ele falava de sua experiência como estudante nos EUA quando jovem. Ele lembrou da forma como os americanos tratavam os negros e como a segregação e o conservadorismo que ele presenciara ainda encontravam-se mais fortes do que nunca sob a administração de Bush. Jabour demonstrava-se extremamente preocupado caso Obama vencesse o pleito (o texto foi publicado um mês antes das eleições).

Também me impressionou uma longa reportagem publicada na Rolling Stone Brasil, escrita originalmente p/ a matriz norte-americana. A reportagem ilustrava os fatos por trás do famigerado e mutante - mas que talvez jamais funcione de fato - escudo antimísseis americano. É muita grana, poder e gente envolvida nestes interesses, que são bancados ferrenhamente pelos republicanos.

Tenho opinião parecida com o do comentário do Leon. Acho que Obama, para a segurança de si próprio, terá de agir como "mais do mesmo" sim. O fato dele ser o primeiro presidente negro da história do que é considerada a maior potência mundial desde o fim da 2ª Guerrra é um feito extraordinário por si só. Mas se ousar mexer em certos dogmas incrustrados pelos republicanos, com as verbas absurdas p/ os militares, a manutenção de algumas guerras por aí e a ausência de pulso forte para buscar uma solução menos parcial no Oriente Médio e também junto à América Latina, será assassinado ou vítima de algum atentado terrorista.

Chantinon disse...

Fábio,
Claro que penso assim também.
Mas se Luther King não tivesse existido?
Se Gandhi não tivesse existido?

Procure pela internet e dá uma lida nas entrevistas do Obama. Sim, ele quer mudanças, mas também ele é "mais do mesmo".

Essa é a grande diferença do Lulismo. Lula hoje faz exatamente TUDO que era feito no governo anterior, só que vende muito mais via propaganda.

O ultimo recurso que restou aos eleitores/defensores do Lula é a nutrição dos pobres. Agora os pobres estão mais gordinhos.

Assim os pobres vivem mais (mais de menos). Geram mais filhos e isso quer dizer mais votos.

Eu não sou Hitler. Não quero ver pessoas passando fome, e não acho que aniquilar todos os famintos resolveriam os problemas.

Lula está patrocinando o aumento dos problemas.

Eu preferia ver crianças sendo obrigadas a ir para escola para poder comer uma alimentação descente. Lembre-se que as escolas fingem dar aulas e também fingem dar uma alimentação... Lembrando que muitas crianças comeram ração de cachorro em escolas públicas graças as regras de licitação, que só beneficiam bandidos.

Obama não está no Brasil.
Lá nos EUA 50% do povo é idiota e alienado. Aqui a coisa beira os 90%. Os 10% que sobram são ricos e não estão nem ai para nada... Como Lula, quanto mais miséria, mais riqueza pessoal para eles.

Existe uma coisa que um amigo socialista sempre fala, e eu concordo: "Não existe grande que não caia, tudo um dia tem um fim".

Espero estar vivendo os dias onde uma grande mudança está começando.

Sobre o militarismo, acho que você deveria ler "A arte da Guerra" e alguma coisa sobre o fim da URSS.

Não existem todas essas armas que o mundo imagina ter. claro que o poder atomico é assustador. Mas se os EUA fossem tão fortes, porque até hoje não dominaram 100% do Iraque? Pq perderam para o Vietnã?
Se for para ter medo, tenha da China, o próximo numero 1 do mundo.

Kalunga disse...

Bom,

eu, como muita gente, quero que Obama represente mudanças! Mas ainda temo por sua integridade caso ele venha a mexer em alguns vespeiros. Admito que estou um tanto quanto pessimista.

Acho que esta crise econômica desencadeada pelos EUA demonstra sim o quanto que a maior potência do mundo pode ser vulnerável. O mesmo para a patacoada que eles estão fazendo no Iraque.

Caso Obama saia-se bem deste lamaçal que ele vai entrar, certamente poderá enfim promover algumas mudanças significativas para a sua nção e, por tabela, para o mundo. Mas o mundo já não vai mais enxergar os EUA como a única força dominante do planeta, pois a lambança desta crise econômica e a guerra do Iraque demonstram que até o Brasil tá podendo se virar sem se foder tanto. França, Alemanha, Japão e, principalmente, a China, estão babando pelo sangue norte-americano querendo uma fatia maior no bolo da dominação mundial.

E eu temo, sim, pela China! Um país que cresce absurdamente em termos populacionais e econômicos e que não é uma democracia.

Sunflower disse...

Desculpa, mas eu vou colar aqui o que já comentei em um outro blog sobre o mesmo assunto -


tá, eu concordo, em partes, com vc. Concordo que a ele ser eleito foi uma coisa boa, talvez, melhor que o MacCain, talvez. Mas eu ainda não consigo ficar toda paêtes e serpentinas e Obanismo (que ismo é bom?):

1. a Esperança é uma faca de dois gumes, por causa da estória da caixa de Pandora, sabe? Ela abre a caixa, as mazelas do mundo saem, e ela fecha apenas em tempo de guardar a esperança. Aí, a esperança é uma coisa boa, pq por mais que as pragas estejam assolando o mundo, esperamos que algo melhore. Ao mesmo tempo, de vez em quando, existe algo ruim, que devemos largar e seguir em frente mas a esperança faz com que nos agarremos aquilo. "Mas, porra, - você me pergunta - se não tivermos a esperança, o que nos resta?". Eu voto pela ponderança. Euzinha. Toooooda torta. É que eu sou do partido que tem horas que devemos chutar o pau da barraca, e tem horas que devemos ter cautela.

2. Outra coisa que vejo recorrente, é o Sebastianismo. Essa história de Portugal que deve ter sido repetida muitas vezes em diferentes aspectos do mundo. "A espera do rei bom". Don Sebastião, o bom rei, partiu para guerra de navio, e por lá morreu, sem deixar um príncipe regente. Então, a corte foi tomada por um rei espanhol e foi um desastre. Os portugueses ficaram pra sempre esperando que o D. Sebastião voltasse, daí a expressão "ficar a ver navios". Foi assim com o Lula, aqui e está sendo com o Obama, lá.

3. Outro ponto histórico é os presidentes dos Estados Unidos que eram super a favor de mudanças. Abrahan Lincoln - vamos unificar esse país e acabar com a escravidão? Bang Bang. JFK?
- vou enviar tropas para o Sul e garantir os direitos dos negros? Bang Bang. Até o próprio Martin Luter King - eu tive um sonho - Bang Bang.

Sei que foram poucos casos, mas repetidos e com repercursão o suficiente para eu me perguntar: Quão a favor de mudança o americano realmente é?

Ah, só mais um adendo, quanto ele ser um presidente boa pinta, nós também já tivemos um, se lembra? A midia o amava e ele proclamou que tem "aquilo roxo"? E a mídia - sempre a mídia - levou com que os jovens às ruas para que rolasse o primeiro presidente da história brasileira a ser afastado por Impecheament.

- NÃO ESTOU DIZENDO QUE ISSO FOI RUIM -

Mas, ei, o cara já taí de volta. E o povo continua esperando por D. Sebastião, continua a ver navios, continua agarrado a esperança, continua a ter o coração partido.

Isso tudo não foi uma réplica a vc, foi mais que um desabafo generalizado, é claro que eu quero o melhor, mas digo cautela com que esperamos, pois acredito que a alma é uma coisa tão linda e tão escassa, que deveria se ter mais cuidado com aonde se põe para que ela não se perca.

Chantinon disse...

Sun,
É um dos melhores comentários que o blog aqui já recebeu.
Concordo plenamente.
Na verdade, esse é um dos posts que todos os que comentaram sabem muito bem o que estão falando...
Deve ser pq o texto não é meu :)